11 de fevereiro de 2010

Quando eu era pequena, adorava chupa-chupas, rebuçados e limonadas muito doces. Aos catorze anos, passava dias inteiros de Verão a tostar na praia, imóvel como uma baleia (esquelética) que tivesse vindo dar ao areal e dali não saisse. Não há amor como o primeiro, diz-se. Mas essas minhas paixões, por doçuras enjoativas, pelo sol esturricante, perdi-as para sempre. Uma delas, no entanto, mantenho desde os seis anos: ler. Mal aprendi a ler, descobri o vício mais dificil de perder que existe e continuo a ser como a menina míope que enfiava a cabeça num livro e ficava cega e surda a tudo o que a rodeava.
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Sem ordem, sem método, sem acompanhamento nem censura. Li muito, li muito mal - de esguelha, não chegando ao fim, saltando páginas, sem fazer fichas de leitura nem prestar atenção ao estilo. Li pelas razões erradas e para fins reprováveis: escapismo, desculpa para não estudar ou não ajudar em casa. E o pior (ou melhor) é que continuo a ser esse tipo de leitora. Por quê? Porque posso, porque podemos. Os livros permitem-nos estas liberdades. Não se zangam se não formos ter com eles quando deviamos ou chegarmos atrasados, se abandonarmos a Anita a meio do caminho para a escola, se tratarmos o conselheiro Acácio sem o respeito que julga merecer e lhe fecharmos o livro na cara, se os trairmos até. Mas, como amigos indulgentes que são, os livros merecem que não os abandonemos de todo. Merecem ser tirados da estante de vez em quando, para as suas páginas arejarem e ganharem nova vida.

Ana Saldanha

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